Retirado da Revista Piauí - Maio/2012.
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Se eu fosse mais disciplinado, poderia ter sido músico
por CLINT EASTWOOD
Primeiro, eu era mais alto do que a maioria das
crianças na escola. Depois, estávamos sempre nos mudando. Redding.
Sacramento. Pacific Palisades. De volta a Redding. De volta a
Sacramento. Niles. Oakland. Eu era sempre o cara novo na turma. Os
valentões pensavam: “Lá vem o altão desengonçado. Vamos testá-lo.” Eu
era tímido, mas passei grande parte da infância socando os valentões.
Meu pai tinha um casal de filhos no início da Grande
Depressão. Não havia emprego. Não havia previdência social. Mal se
conseguia sobreviver. Naquele tempo as pessoas eram mais duronas.
Vivemos numa geração meio mariquinha, todo mundo diz: “Vamos lidar psicologicamente com
isso?” Naquela época, você simplesmente sentava o pau e resolvia na
porrada. Mesmo que o cara fosse mais velho e fortão, pelo menos você era
respeitado por encarar a briga, e te deixavam em paz.
Não sei se dá para dizer exatamente quando começou essa
geração mariquinha. Talvez tenha sido quando as pessoas começaram a se
perguntar sobre o sentido da vida.
Se eu fosse mais disciplinado, poderia ter sido músico.
Meu pai morreu subitamente aos 63 anos. Simplesmente
caiu morto. Por muito tempo, me perguntava: Por que não joguei mais
golfe com ele? Por que não passei mais tempo com ele? Mas quando se está
tentando fazer sucesso, a gente ignora essas pequenas coisas. Isso te
dá um certo arrependimento mais tarde, mas não há nada que se possa
fazer. Você simplesmente segue em frente.
Detalhes menores são menos importantes. Vamos em frente com as coisas realmente importantes.
O que aconteceu é que eu estava indo para a faculdade
em 1950. Los Angeles City College. Um cara que eu conhecia frequentava
um curso de interpretação nas noites de quinta-feira. Ele me falou das
meninas bonitas e disse: “Por que você não vem comigo?” Então, eu
provavelmente tinha segunda intenção além da ideia de ser ator. E ele
estava certo. Tinha muitas garotas e poucos rapazes. Eu disse: “Mas é
claro, eles precisam de mim aqui.” Acabei na Universal como ator contratado.
As pessoas no mundo inteiro adoram western.
Tem aquela fantasia em relação a um sujeito que luta contra os outros.
Ou até mesmo um mau sujeito e os outros. É um contexto mais simples, um
mundo sem lei.
O último que fiz foi em 92. Os Imperdoáveis. Um roteiro maravilhoso. Mas parecia o fim da linha para mim nesse gênero, porque resumia tudo o que eu sentia sobre o western naquele momento.
Tive um problema no Conselho Municipal. Me lembro de me
levantar e ver uma senhora que estava tricotando o tempo todo, sem
nunca erguer os olhos. “Não, não, não”, ela dizia. E eu pensei: Não pode
ser assim. Quando você é eleito, tem que pelo menos fingir que está
interessado no que as pessoas estão fazendo. Como é que alguém tem a
cara de pau de simplesmente ficar sentado e não prestar atenção, não
interagir? Isso precisava ser corrigido.
Ganhar a eleição é o tipo da notícia boa e má. Ótimo, agora você é o prefeito. A má notícia: agora você é o prefeito.
Garantir que as palavras “servidor público” não sejam
esquecidas. Por isso eu me candidatei. Porque pensei, eu não preciso
disso. O fato de eu não precisar me fez pensar que eu poderia fazer
mais. É das pessoas que precisam disso que eu desconfio.
Barack Obama seria inimaginável quando eu era criança.
Muitas orquestras grandes vinham a Seattle quando eu era jovem. Os
músicos podiam tocar, mas não podiam frequentar o clube.
ocê precisaconhecer
alguém realmente, ser amigo de verdade. Minha mulher é a minha melhor
amiga. É claro que eu me sinto atraído por ela, mas não se trata disso.
Já me senti atraído por outras pessoas, mas depois de um tempo não
conseguia mais suportá-las.
Tenho filhos com outras mulheres. Tenho que reconhecer o
mérito de Dina por reunir todos eles. Ela nunca teve aquela coisa de
ego da segunda mulher. O instinto natural poderia ter sido de matar todo
mundo, uma mentalidade de mulher das cavernas. Mas ela conseguiu juntar
todos. Ela é simpática com a minha primeira mulher, amigável com minhas
ex-namoradas. Ela se esforçou para unir todos nós. Isso exerceu imensa
influência na minha vida.
Não, eu não tenhoque treinar aquele grunhido.
Simplesmente vou lá e faço. Quando você está no personagem, você está no
personagem. Não fico pensando: Vou grunhir aqui, o u vou gemer ali.
É por isso que não ensaio muito e filmo imediatamente. Tenho ideias sobre para onde gostaria de levar o personagem, mas nós dois acabamos indo juntos.
Estávamos fazendo Na Linha de Fogo. John
Malkovich está no topo de um prédio, numa situação bem precária. Meu
personagem é louco, saca uma arma e enfia na cara de John, e John põe a
boca no cano da arma. Eu não tenho ideia de que tipo de símbolo maluco
era aquele. Nós certamente não ensaiamos nada parecido. Tenho certeza
que ele não pensou naquilo quando ensaiamos. Simplesmente estava lá.
Como sir Edmund Hillary falando sobre o porquê de fazer alguma coisa:
porque está lá. É por isso que se escala o Everest. É como um pequeno
intervalo de tempo, e assim como uma ideia vem rápido, você simplesmente
a joga fora e descarta. É só fazer antes de descartá-la.
Continuamos dizendo sempre: “Chegamos até aqui, não vamos estragar tudo pensando.”
Você olha para um Velásquez da fase escura e pergunta:
Como é que ele conseguiu pintar assim? Tenho certeza que ele não disse
para si mesmo: “Estou aqui na minha fase escura, então tenho que pintar
dessa maneira.” Ele simplesmente pintou. É quando a verdadeira arte tem
a chance de entrar em cena.
Menina de Ouro ganhou o Oscar. Foi legal, foi
ótimo. Mas não dá para se impressionar com isso. Muitíssimos filmes bons
não ganharam o Oscar, então isso não tem muita importância. Cartas de Iwo Jima foi
indicado ao Oscar. Não ganhamos, mas aquele filme era o melhor que eu
poderia fazer. Será que ele merecia menos do que algum outro filme? Mas
há outros aspectos que entram em jogo. No final, você tem simplesmente
que ficar feliz com o que fez. Ali está você.
fuen, obrigada por fazer a minha noite um pouquinho mais feliz, e por ter me inspirado a ponto de não pensar no minuto ou na manhã seguinte como uma continuação, mas como um outro possível começo.
ResponderExcluirneni